quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

antes do ano acabar


"Então pense. Pense mais do que devia."

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

...



tudo bem.
mas a gente podia ser mais.
tão mais.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Dramático e espetacular


Caba logo com isso.
deixa eu sofrer a minha falta de paciência,
meu rancor, minha arrogância.
Guardei as vozes dentro da sua voz em mim
e não quero essa que você insiste em repetir
monocórdica...
na verdade é um blá blá blá sem fim.
meu e seu.
"Um ontem que não existe mais" tocando sem fim
no celular.
Paulinho! me salva dessa dor...
Náufrago.
Paixão triste.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Pandora


Se vivêssemos numa tragédia, eu teria acabado de cometer a desmedida. Falo daquele ato que ultrapassa um limite muito particular, o instante definitivo, algo que, uma vez rompido - ou ultrapassado - transforma tudo e de vez. É como se a partir dessa linha rompida, ou desmedida violada, nada mais pudesse ser visto como antes. É como se os Deuses, ou as forças maiores, ao perceberem a minha violação, me dissessem imediatamente e sem perdão: "viverá as conseqüências dessa atitude, senhorita."
Vivo então a transformação da minha figura trágica, ou dramática, do limite que me relembra do lugar que ocupo e jamais saí: lugar de mera mortal (perdão, Deuses!), lugar de mera mulher.

My darling, oh my darling, desmedi-me. E agora? Pra onde vamos?

terça-feira, 16 de novembro de 2010

sobre amarrar alguém no próprio punho

esperar por você virou rotina. mania antiga. alimentar sonhos guardados em caixas velhas. eu me apaixonei. de você não sei. se sou eu que vou sempre, o que resta? 
transformo o desejo em saudade. sei que você nunca vai ser controlador dos meus passos: não. você também sabe disso e tem medo. você sequer escolhe seu próprio desejo. desejas alguém que segure forte sua mão e diga: "estou contigo sempre, todos os dias, todas as noites." sabes que te abandonarei todas noites, principalmente no inverno. sabes que estarei sempre regada de viagens, encontros, pessoas, mundos. você prefere o silêncio, e aí fica. mesmo assim, te dou a mão daqui e digo: "estou contigo agora, todo esse dia, toda essa noite" e espero que falar do instante seja suficiente. espero que dizer de saudades seja bonito o bastante, sem promessas longínquas, já que vivemos, nesse mesmo instante, na busca infindável de nossos passos. deixemos o amanhã de lado, te quero agora. e isso, sim, isso há de ser o suficiente.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Como se fosse agora...


Estou cada vez mais perto e você pensa:

Estou cada vez mais longe

E a lembrança só se faz distante

Mesmo perto sei que não estou dentro

Mais um dia...eu passo os dias à ferro e sonho

Sempre perto e nunca antes

Sempre perto e nunca sendo

Sempre enquanto e nunca a tempo

É como se fosse agora o que já é muito.

Por quanto mais?

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

pode


se nem um jogo de dados será capaz de abolir o acaso, o que nos resta? tudo pode dar certo, meu bem. 
tudo pode ser exatamente como a gente nunca sempre quis.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

acordes dissonantes

eu vou fazer uma equação política
poética
trágica
pra fazer ser pura a nossa lógica
exótica
o jeito nosso de amar não vai caber num lugar



vou me esquecer do que parece sádico
fatídico
estético
estático
compor então de modo prático
único
complexo
enfático
o jeito nosso de amar não vai caber num lugar



descrevo aqui essa distância mística
imagética
internética
vasta
e veja só no que se torna agora
o nosso amor em valsa
e segue sendo assim sem medo
mudo
mágico
como uma dança que de tão leve o passo
se for sozinha em duo
se faz em dois em laço.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

um...dois...três...


conto as horas, os minutos, os instantes todos. chove muito lá fora e eu não ouço nada. tem muito mais barulho aqui dentro. eu sabia que você viria. viria como se fosse daqui e tivesse estado sempre por perto, do meu lado, contando estórias sérias e questionando o que ninguém questiona. 
eu sabia que um dia a gente estaria compartilhando mais do que palavras à distância. as nossas palavras encontram destino na conversa. conversa pura, rara, nossa. pulamos a etapa da ilusão, os auto-enganos, o conto de fadas. 
como é que se começa uma estória sabendo exatamente onde se pisa? pois não sabemos. e vamos em frente. e existe o medo, a vontade, o desejo, o risco, o frio na barriga, tudo isso que também faz parte das coisas boas. mas nada disso nos paralisa, nem a lógica vigente, nem a boa conduta, nem a correria dos dias. vamos em frente pelo caminho que a gente mesmo escolheu. um pé depois do outro, uma leveza, o cuidado de quem conduz um instante ínfimo. 
______________________
já somos. 

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

encontro



Tentavam reinventar o amor. Percorrer longas distâncias em uma lógica outra. Compreender a lógica da velha fotografia guardada em recorte de jornal.
Passaram a madrugada colhendo estórias. Sem medo de dizer, disseram tudo - até o que talvez não diriam. A distância virou impulso. Pra que mentir?
Precisavam de respiro. De fôlego. De tempo. O tempo certo pra maturar sem pensar demais. O tempo certo das coisas serem. E seguir em frente, de olhos fechados. O corpo guiaria.
Toparam o risco. Uma palavra seria muito mais que uma palavra. E o silêncio existiria - faria parte, como solo pra palavra existir.
Na porta de casa, de olhos abertos, no abraço, não restava dúvida.
- Promete?
- Prometo.

sábado, 18 de setembro de 2010

Alegria e beleza


Guardar a dança.
Passar a semana contando as horas queimadas de canção e madrugada.
Te dar um presente, um girasol e uma voz.
O dia amanhece e as horas descem rua afora.

"Agora vambora...Estamos meu bem por um triz..."

O ator.
A atriz.
Dançam.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

primavera


espero sua chegada como quem espera um sinal prometido. tic tac do relógio, atravessando os dias, um instante após o outro a memória faz cócegas. espero sua chegada como se fosse promessa. não promessa sua, de algo que você é ou pode vir a ser. tampouco tenho projetado em você algo de insuperável - perigo maior das esperas. no entanto, sua chegada soa promessa. talvez presságio. será?
espero sua chegada debruçada na janela, sozinha, os olhos no jardim. vezenquando levo as mãos nos bolsos, procuro algo, encontro papéis, papéis, papéis, papéis, papéis e algumas palavras soltas. não sei  bem desde quando elas estão ali, soltas, sozinhas, procurando destino. 
não espero sua chegada como quem espera um destino. também não procuro nada, nem desespero. apenas vivo uma alegria mansa, descuidada de sentido e de valor. vazia de acordes. sem pressa.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

desejo

desejo encontrar um amor que seja capaz de não dizer:
- minta pra mim.

domingo, 22 de agosto de 2010

noite

Era preciso voltar. Ver de perto bem de perto o que restou. Que espécie de amor era aquela. Era preciso com as mãos abertas redescobrir uma estória. Despedaçar. Esquecer pra lembrar. Inventar outra. 
Ele decidiu visitá-la. Ela abriu a porta como jamais pensou que abriria de novo. Recebeu de braços abertos, abraços. Os braços dele. Ele estava de volta.
- Eu percorro distâncias longas demais pra te encontrar. - ele disse. Ela riu em silêncio quase-em-tom-de-sarcasmo. Ele sabia bem que era ela quem vinha de longe. Era ela quem vinha. Sempre.
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Ele entrou na casa. Sentou na mesa. Tomou café. Sorriu. Ela sorriu de volta. Falaram de coisas, trabalhos, desejos, destinos, brasil. Pra onde vou? Pra onde vai? E hoje? E agora? E o que mais? Mais risos. Ela estava a vontade. Pediram cachaça, brindaram, beberam. Em silêncio fizeram um pacto: jamais comentar sobre o acontecido - essa seria a única estratégia pra continuarem sendo próximos.
Ela olhava pra ele como quem olha um parente que envelheceu. Havia ternura, mas já não era mais tão especial. O amor tinha se tornado menos promessa. E era amor? Não esperava. 
Ele talvez esperasse. Procurou na sala a menina de meses atrás. Aonde? Cadê? Sumiu?
A noite caiu noite adentro. Ele resolveu partir. Despediu-se duas vezes, como quem esquece que já disse adeus e chorou. De novo ao pé da porta, disse ao pé do ouvido: "Muito bom te ver, minha menina."
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Ele foi. Alta noite ia, um homem velho caminhava sem jeito de olhar pra trás. 
Ela na janela, sorriu de perto e viu a morte de um tempo que passou. Olhou pra frente. Voou.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

demodê


Cinco anos depois, no pós do pós do pós, tenho notícias suas. Logo agora, que me encontro aqui, no entre. No espaço que antecede o salto e já não é mais pouso. Se fosse música, eu estaria tocando em fermata.
Nossos encontros tornaram-se rasos com o tempo. Ocasionais, vazios de discurso. Melhor assim, não sei bem o que foi que nos ligou durante o tempo que éramos juntos.
Passou. 
Passou.
E agora, justamente agora que meu pé toca o entre - o mesmo entre que você pressentia cinco anos atrás e me falava, agressivo, que um dia ele chegaria - me vejo em emaranhados de trajetos. De rumos. Possibilidades. Perguntas. Dores de barriga. Não encontrei ainda um colo que te tirasse da referência maior. Mas sigo.
Só que hoje, cinco anos depois, na hora do almoço, tenho notícias suas. Notícias vindas de um pombo-correio inadequado. Um motivo pra sua ausência de delicadeza - por ela perdi minha vida. Lembra? 
Você não lembra. Claro que não lembra. Pois justamente agora entendo o trajeto que você nunca descartou. O suposto caminho do artista vago, impostor. A velha turma, o iê iê iê. Viver eternamente adolescente, nada é mais demodê.
É triste ver. Tanto fulgor pra nada, um caminho desperdiçado.
_
Parabéns Pierrot, você continua um palhaço.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Hébuterne. Talvez fosse isso...


Os dois olhos vazados na fotografia diziam que a brasa do cigarro tinha feito mais estrago que o previsto. Era uma segunda feira braba e eu não tinha muito controle do que entrava e saia de mim. Meses vivendo uma alegria besta de vaca, de carne, de vigília estúpida esperando mais felicidade, mais alegria, mais verdade deixando passar a hora de comer, a hora de tragar sem culpa o tempo.
Me virei para o lado tentando encontrar que horas eram. O som da cidade do lado de fora do apartamento tinha um som aquático, marinho e eu começava a naufragar antes mesmo de começar o dia. Sentei-me na cama como quem finge que precisa se lembrar o que aconteceu no fim de semana mas eu não queria. Mas era preciso por uma culpa estranha de não se lembrar de nada. O dia caminhava rumo ao começo da tarde e sempre que é assim (e isso tem acontecido várias vezes nos últimos meses) fica em mim a sensação de ter gritado toda minha raiva por tudo que eu não entendo entre a sexta e o domingo com todos os sons possíveis, toda a força do me ar, dos meus dedos, da minha vontade. Perdi meu final de semana gritando uma verdade que não conseguia me lembrar naquela segunda.
Ou era terça? Quarta?...Quinta...Sext.....

quinta-feira, 1 de julho de 2010

colcha de retalhos



amores antigos voltam com toda força em momentos de evidência.
minha cabeça dói.
já não reconheço o amor.
nunca tive habilidade para compromisso.
não coleciono sogras.
nem estórias.
um sujeito de longe acena vinda para a contemplação.
outro desaparece em silêncio, em sinal de coisa esquecida.
queria nascer para o instante.
guardar em grandeza o ínfimo.
agradecer o nada, por ter me dado tanto.
tenho alguns anos de vida, poucos de coração.
o amor maior em mim não há.

domingo, 13 de junho de 2010

na bubuia

ontem foi dia de lembrar que amor não é nada daquilo que a gente pensava.

domingo, 30 de maio de 2010

um pouco


o que ficou na vontade
de querer um pouco mais
pra ver de perto o que seria 
pra onde iria
um pouco menos de cálculo
um pouco menos de chão
o que ficou na saudade
de tudo aquilo que não
pronunciava em silêncio
te dar a mão
um pouco menos de susto
um pouco mais de ilusão
o que seria da gente?
e que estória era essa?


nosso amor não foi
virou promessa

sexta-feira, 21 de maio de 2010

assim

a-mar é verbo pra se conjugar em liberdade. que nem o oceano!

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Saudade não!


Você falou que sentia saudade. Não acredito, você falou que sentia saudade. Como que pode uma coisa dessas? Você falou que sentia saudade. É quase absurdo: saudade! Saudade!
Eu escutei em silêncio essa palavra errada. Eu engoli seco. Eu ri. Eu quis dizer que sentia uma porção de coisas que não eram saudade. Eu quis dizer que nem sequer sentia. Deveria ter dito:
"Não sinto nada. Nada nada nada. Mas fique tranquilo, eu ainda respiro."
Ou deveria ter citado aquela música:
"Agora o meu coração toca no vazio. Agora o meu coração não queima nem pavio."

E eu deveria ter saído pra queimar alguma coisa diante dessa sua declaração assustadora. E eu deveria ter respondido à altura.

Acabei falando bobagem. Grrrr. Mas não nos preocupemos, o destino já tratou de resolver as coisas.


Saudade não!

terça-feira, 4 de maio de 2010

Saudade


Divertida mesma essa história.
Olha, faz tempo que não ouço uma dessas.
Cara, de onde você vem com essas?
Eu realmente não sei como vivi sem saber disso.
Me dá seu sapato? Quero te fazer engolir o salto.
Reclama agora que você é pequena, reclama.
Eu vou te levar pra casa dentro de uma sacola plástica
te congelar e servir no domingo antes do jogo de tira-gosto.
Eu vou chorar um pouco agora.
Divertida mesma essa história.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Menos difícil


[Queria que fluísse. Que não tivesse que pensar no que pode e no que não pode. Que não precisasse calcular gestos. Que não optasse por omitir os desastres do mês de abril. Queria que fosse. Que não tivesse que fingir espontaneidade. Que falasse coisas bonitas e coisas toscas. Que conseguisse dividir o travesseiro. Que cantasse em uníssono as canções de Bregovic. Queria que caminhasse. Que não desejasse a pretensão de algo grandioso. Que não se enchesse de medo. Nem de angústia. Queria que fosse. Que soasse puro e simples. Que parecesse com os sonhos de criança. Que surgisse da sintonia de dois somente um querer.]

domingo, 4 de abril de 2010

lágrimas negras


De onde estou não me peça pra entender
Não adianta
Não adianta
Não adianta
Sobra um nó engasgado no peito
Um dilaceramento da garganta
Um silêncio duro
Uma distância
Tem aí um limite intranspassável
Alguma coisa se quebra e se transforma
Não são porquinhos que se restituem
Nem primaveras que voltam inteiras
É algo da ordem do irreversível
É mais duro
É mais sério
É mais cru
É pior
A lógica das sensações
A lógica do acontecimento
Não voltaremos ao que fomos
Não voltaremos
Não seremos
Não somos.

sábado, 3 de abril de 2010

Não fumo cigarros.


Tinha medo de atravessar a linha proibida.
Aquela linha tênue que separa, no amor, o possível do improvável. Aquela linha que, uma vez atravessada, poderia colocar tudo a perder.
- Quanto posso demonstrar? Quanto posso querer?
Não queria assustar o outro com seus passos apressados outra vez. Sentia desejo como sempre sentia desejo - o desejo pra ela era algo que não poderia ser nada mais nada menos do que grandioso, independente do que fosse. Se desejava, já era intenso. E isso ela sabia que assustava - não ela, que desde nova assumiu ser capaz de correr riscos. Mas o outro. Os tantos outros que passaram por sua vida.
Foram muitos os corações que ela foi capaz de assustar na demonstração do seu desejo.
Não conseguiu nunca fazer o papel da charmosa mulher que, enquanto fuma seu cigarro, lança olhares tortos aos homens durante uma noite esfumaçada. Sempre fora a mulher que tropeçava. A mulher que caía. Que falava alto e ria revelando os dentes. Que derrubava cerveja na blusa branca do flerte no primeiro encontro.
Sem conseguir ser estrela da nouvelle vague, tentava fingir que queria menos que queria - enquanto tentava verificar em si, sempre, se queria tanto quanto gostaria de querer. Tinha uma predileção por grandes encontros, dramas, romances em torpor. Fantasiava com estórias arrebatadoras até mesmo antes delas acontecerem.
De qualquer maneira, o momento era de cuidado. Não queria meter os pés pelas mãos outra vez. Caminhar na corda bamba, ligar menos, balançar os cabelos querendo dizer indiferença. Mesmo sendo aquela que derruba cerveja, deveria fingir, pelo menos por alguns instantes, ser a lady charmosa no canto da noite noir.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

A palavra escrita


Desapareceu como se nunca tivesse existido
sem deixar memória nem vestigios só a sensação
de que esteve mas não estava.
Abandonou a sala desarrumada depois da festa
e deixou um bilhete para o dono da casa:
Espero que compreenda.
E foi incompreensível a precisão da escrita,
a temperatura da linguagem.
O dono da casa esqueceu as palavras e o sentido delas
e ficou olhando pras próprias mãos que doiam e esperou
até a última folha da pitangueira e cantou aquela valsa
que fala das estações e viu aquele filme e viu outro daqueles
filmes e foi embora e foi sorrindo, e chorava e escrevia
aquelas palavras e todas aquelas palavras dentro das palavras
e nos espaços em branco entre as palavras cheios de fios invisíveis
e mato e partículas de saudade e pó.
E não se lembrou mais que alguém ou alguma coisa etérea e transparente
Desapareceu como se nunca tivesse existido
e dormiu sem querer compreender nada.

segunda-feira, 29 de março de 2010

lamentações em fado


ai quem me dera ter pra quem cantar:
"és meu único navegador e eu te amo".

quinta-feira, 25 de março de 2010

borboletas


Expectativa expectativa expectativa expectativa expectativa - nada mais poderia dizer sobre isso.

Apenas um frio na barriga que rondava.

domingo, 7 de março de 2010

quando é bem mais que amor


- Você é sempre responsável por aquilo que conquista.

Foi essa a frase que escutou nos primeiros anos de vida. A menina, ainda criança, ouvia da voz da avó no canto da sala essa afirmação quase assustadora, quase terrível. Como poderia ser ela tão jovem responsável por qualquer tipo de conquista? Como poderia ter certeza do que conquistava e de quem? Mais tarde pode ler algo parecido num livro que todas as mães recomendam aos filhos. Só que ao invés de conquistas, o livro falava sobre cativar. A palavra "cativar" soava mais leve - mais isso não vem ao caso.

O fato é que a menina cresceu um pouco, ganhou dinheiro, peso e alguma experiência. Ainda assim, era menina. Sorria inocente pras coisas, queria o mundo feito criança. Falava de forma empolada mas acreditava em sinais, acontecimentos mágicos e no amor. E conquistava, até aquilo que não pretendia.

"Crescer requer coragem" - foi outra frase que escutou bastante enquanto crescia. A menina ainda estava em fase de crescimento, na fase em que as pessoas parecem bobas e os amigos de verdade vão morar fora. Os pais ficam velhos, frágeis e sair no sábado à noite não parece a melhor das soluções. A menina crescia cheia de medo escorrendo pelas pernas e pelos olhos, mas crescia. Ganhava asas.

No amor, errava. Desejava conquistar corações impossíveis. Passava dias pensando em como tocar um homem quase intocável. Homem esse que tocava as teclas de um piano como quem escolhe flores. Dentre tantas moças da cidade, ele havia escolhido por ela, a maior margarida. Ainda assim, ela não conseguiu conquistá-lo . Ainda (tinha esperanças).

No outro topo do país, conquistou um homem que não pretendia. Assim, no susto, como uma imagem cravada na câmera de fotografar. Ele a desejava inteiramente e a queria como ela sempre desejou ser querida - e isso a assustava. Não se apaixonou pelo único homem que a amava.

Quando pensava na mágoa que poderia causar ao homem conquistado, lembrava da frase da avó e quase sentia culpa. Fechava os olhos rapidamente como quando era criança - naquela época fechar os olhos tinha o poder de fazer as coisas sumirem, em mágica. Na vida real era diferente. As coisas não sumiam e ele a amava. As coisas não sumiam e ela sonhava com o homem do piano.

Crescia como margarida no canto de um quarto escuro. Indo pra algum lugar, indo, endo, sendo. Olhava pra frente e via as coisas turvas. Não tinha certezas. Não tinha porquês.

O mundo estava ali pra ela e ela estava ali pro mundo.

Abria os olhos.
Ia.






sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

E venta...


Guardou o livro dentro da bolsa.
O mesmo livro que ela também estava lendo.
Cantou sua canção preferida.
A mesma que ela também cantava naquele dia.
Pensou em rever o filme que mais gostava.
O mesmo filme que ela também disse que adorava.
E disse sim sozinho no meio da rua
quando ventou forte dançando as folhas das pitangueiras.
Mesmo que não houvessem pitangueiras naquela cidade, naquele país.
No seu país havia o vento, as pitangueiras e outras palavras
que eram deles.
Eles, ele e ela, Ela.
A palavra Ela dentro do nome dela
e dentro do nome dele um diamante.

Ele esperava encontrá-la na rua e disse isso pra ela.
Ela disse que sempre esteve lá. Com ele.
E de fato estava.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Como será a bandeira do nosso país?


E foi muito estranho e feliz a conversa.
Sem som, sem olhos, sem sinal de mais tarde nunca mais.

Espera, escreve, pensa, escreve, espera.

A canção, os musicais, cores de bandeiras de países que inventamos,
quadros de medalhas, sonatas e tudo mais.


Espera, escreve, pensa, escreve, espera.

E dançamos usando as palavras, escolhendo cores, aguardando o ouro.
Nadando sem piscina.

Espera, escreve, pensa, escreve, espera.

Tarde de Domingo na ilha de grande Jatte de Seurat
e o verde das nações.

Espero, penso, escrevo, espero, penso e penso...

I'm singing in the rain
Just singin' in the rain...

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Por uma vida mais vermelha


Estava naquele tempo em que muitos diriam ser verdadeiramente produtivo. Tempo de boas colheitas, tempo de acontecimentos. Nunca sua agenda de telefone foi tão cheia de possibilidades. Números, tamanhos, endereços, proporções. Colecionava estórias de verão em absoluto torpor. Ou não.
Caminhava pela cidade como quem desbrava o mundo. A brisa escorrendo pelos cabelos, o peito cheio de desejo e pavor. Havia um ano inteiro pela frente, um ano novo, um ano que haveria de ser único.
Não tinha aprendido muito ao longo da vida. Cometia os mesmos erros. Tinha a alma velha, sendo jovem.
Estava no tempo de primavera, atraía olhares de todos os tipos. Estava bonita. Estava muito bonita.
Caminhava pela cidade como quem abraça o avô na cadeira de balanço. Chorava por todas as saudades desse mundo. Carregava amor nos passos.
Os pés passavam do Teatro até à biblioteca. Do mar até ao carnaval. Tinha um mundo inteiro ao redor, mas era só. E não havia escândalo.
Estava naquele tempo de companhias, de abraços e de encontros. Mas era ela mais do que nunca.
Pela primeira vez depois de tantos anos, respirava sozinha.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

O dia que abandonei Samantha e o vício


Esvaziar o cinzeiro
Deixar o dia inteiro ser o dia inteiro e anoitecer.

E desaparecer de verdade

com todas as caixas, os maços, os isqueiros,

com toda a beleza da fumaça,

a ressaca,

o mal cheiro e o

Glamour.


Deixo tudo para o cinema Noir.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Manga


Cavado o buraco mediu bem o diâmetro da própria cabeça pra ver se cabia.
Cabia e ainda sobrava espaço pros braços.
Mas os braços era melhor pendurá-los no galho de uma árvore pra pegar um ar.
Já que não sabia voar era provável que por dentro da terra fosse seu lugar
ou quisesse que fosse.
Olhou, mediu, assobiou, Silvou, tossiu e decidiu saltar.
O buraco parecia um vizinho, uma assistente social, um porteiro.

Manga.
Manga pra depois do jantar.

Tirou a camisa, pendurou junto dos braços e serenou.
Outras horas depois já descalço tirou os pés usados
e saltou.
O buraco tinha 2 centimetros
mesmo assim foi até o fundo
e desapareceu.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

efêmero


Colecionava amores efêmeros como quem coleciona livros. Assim, os mais raros. Assim, os mais distantes. Amores curtos longos de verão. Amores suados, inundados de palavras ocas, vãs. Amores de onde se enxerga o ponto em que termina. Ainda assim, amores.
Começara cedo, era menina. Sabia desde sempre que o amor se fazia na impossibilidade de sua permanência. E que justamente por isso, amores com prazo de validade conseguiam ser mais potentes. Não se economizava sentimento, não se economizada vida. Era amor devorado como as páginas amarelas lidas em silêncio (em sufoco).
Começara cedo e seguia o rumo sendo assim. Se apaixonava justamente por quem morava longe de casa. Quanto mais longe, mais amo. E começava estando perto, muito perto, e desse tão perto não se fingia nem dispensava. Havia de se viver tudo com a máxima intensidade, era declarado o dia em que tudo terminaria. Vivia vivia vivia, as emoções escancaradas em limpidez. Não havia porque fingir que não.
Como quem coleciona livros roubados, vivia amores das mais diversas localidades. Copacabana, Salvador, Budapeste, Londres, Itapema, Madagascar, Estocolmo, Barreirinhas, São Gotardo, São Gonçalo, São Paulo, São Luís. Km de distância marcavam o tempo justo das coisas. Era sabendo-se distante que se fazia mais sincero. E puro.
Um dia chegaria a data de validade. Dia de devolver o livro na Biblioteca. Dia de comprar a passagem de volta. Pois é claro que se poderia tentar forjar a data do fim. Esconder o livro dentro da blusa, queimar as malas, tampar o rosto. Ainda assim, não haveria remédio. Existia um prazo de validade. Não há amor que sobreviva ao amor.
Voltava pra casa então. Passos lentos emoldurados de lágrimas. Todas as lágrimas do mundo de todas as nacionalidades todas as cores. Voltava pra casa sozinha outra vez.
Colecionava amores efêmeros como quem coleciona livros.
O coração escorria pela boca.
Dizia: sim.